Dez anos depois, o medo ainda não levantou voo de Maracangalha

A estrada mal pavimentada e a típica paisagem de interior revelam o clima bucólico de um pequeno distrito às margens da BA-512. O povoado de Maracangalha, que integra o município de São Sebastião do Passé, parece um lugarejo onde quase nada acontece.

Mas, no dia 14 de março de 2007, um avião bimotor carregado com R$ 5,56 milhões caiu na Fazenda Nossa Senhora de Lourdes, matando quatro pessoas. Dez anos depois, uma verdadeira novela que começou como uma comédia pastelão e se transformou em filme de terror ainda provoca medo na população.

“O que mais teve por aqui foi ladrão. Eles chegavam em motos, se apresentavam como policiais e invadiam as casas das pessoas, faziam batidas, agrediam. Foram tempos de muito medo, mesmo”. O relato é de quem viveu a situação de perto. A dona de casa Ângela Portela dos Santos, 33 anos, nasceu em Maracangalha e relembra que aquele foi, sem dúvida, o período mais nebuloso do povoado.

A notícia de que havia uma fortuna a solta na região, tal qual os tesouros perdidos nos mares, despertou o interesse de piratas modernos que, equipados com armas, capuz, e muita cobiça, espalharam o pânico na área.

Antes e depois da chuva
Segundo dona Ângela, de tão significativo que foi o acidente, a história de Maracangalha está marcada entre antes e depois da “chuva de dinheiro”. “Sempre que alguém de fora passa por aqui e puxa uma conversa, pergunta: aqui que caiu aquele avião cheio de dinheiro? Foi um marco nas nossas vidas”, lembra.

Apesar do receio do passado se manifestar nas expressões e palavras da moradora, ela é uma das poucas que se dispõem a falar sobre o acontecido. A maioria absoluta da população foge do assunto como o diabo da cruz. Dez anos não foram suficientes para riscar da memória o pavor.

O medo e a fazenda abandonada
Como ocorrem nos abalos sísmicos, a área mais próxima ao epicentro do tremor é sempre a mais afetada. No caso do acidente com o avião de transporte de valores, o núcleo da questão é a fazenda Nossa Senhora de Lourdes.

A pintura do casarão descascada, os pastos secos e tomados por ervas daninhas, o curral incendiado e nenhuma alma viva encontrada para dar qualquer explicação sobre o que se passara foi tudo o que restou da propriedade. No seu silêncio, entretanto, assim como acontece com a comunidade de Maracangalha, a fazenda berra essa turbulenta e obscura história.